sobre Goffredo Telles Junior

Goffredo na Constituinte de 1946: o chamado da política

"Ser deputado não estava nos meus planos de vida. Não estava, nem de longe, dentro das possibilidades de meu orçamento...O entusiasmo de todos me contagiou".

Em 1945, Getúlio Vargas foi eleito senador por dois Estados e deputado Federal por sete. Doutor Carlos Cirilo Júnior chegou em segundo lugar. Aos 30 anos de idade, Goffredo da Silva Telles Jr. obteve a terceira votação no país naquele pleito.

Em 1946, a atuação do jovem Goffredo em um cargo político atingia o ápice, com a participação na Constituinte. Observador, o ilustre Mestre viria a narrar, no futuro, o calor do momento. "Uma saraivada violenta de discursos caracterizou as primeiras sessões da Constituinte de 1946. Era a manifestação da bancada comunista, quase monopolizando a tribuna parlamentar. Era o desafio incontido, a expansão ruidosa daqueles que foram submetidos à repressão e ao arrocho, durante anos a fio."

Mas, como era de esperar do espírito arguto do Professor, não se deixou intimidar pelo que parecia a opinião da maioria, ou dos mais fortes. Em verdade, respondendo a um discurso de Luís Carlos Prestes, Goffredo da Silva Telles Junior defendeu que os comunistas não eram os únicos a entender de marxismo.

"A política é vida, é realidade vivida. A política construída em gabinete se esfacela em contato com a realidade da vida. A doutrina do Estado não pode vir como um rolo compressor, impondo uma ordem imaginada. O Estado é organizado para servir aos homens, e, se os homens devem servir ao Estado, é para que este sirva melhor aos homens.

O esquecimento destes princípios, aliás primários, acarretou dois erros políticos, que todos bem conhecem: o individualismo e o totalitarismo. O individualismo é o esquecimento de que o homem deve submeter-se à sociedade, como a parte se submete ao todo. O totalitarismo, da direita e da esquerda, é o esquecimento de que a sociedade e o Estado devem submeter-se ao homem, como os meios se submetem aos fins."

Da sua participação na Constituinte de 1946, vale a pena narrar um fato. Ao se deparar com a emenda 3.159, Prof. Goffredo profere discurso alarmado. Dizia a emenda "É vedada a organização bem como o registro ou financiamento de qualquer partido ou associação cujo programa ou ação, ostensivo ou dissimulado vise a modificar o regime político e a ordem econômica e social estabelecidade nesta Constituição".

O receio do Mestre era de que a Constituição tivesse princípios inconciliáveis com a democracia. Após seus argumenos lúcidos, a emenda 3.159 desapareceu da pauta.

Seu discurso no plenário assim terminou:

"O Brasil – bem sabem os srs. Constituintes – não precisa dos demagogos da pseudodemocracia. O Brasil precisa daqueles homens públicos que tenham, no espírito e no coração, o verdadeiro e profundo sentimento democrático; daqueles que estejam firmemente dispostos, por pensamentos, por palavras e, sobretudo, por atos, a respeitar a opinião alheia."

Um estudo de Sérgio Soares Braga traça um perfil socioeconômico e regional da Constituinte de 1946 – "Quem foi quem na Assembléia Constituinte de 1946".

Veja abaixo o que traz o trabalho acerca do Professor Goffredo.

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GOFFREDO DA SILVA TELLES JÚNIOR - PSD

DADOS PESSOAIS E FAMILIARES:

Nascimento: 16 de maio de 1915, São Paulo, SP.

Descendente de tradicional família de proprietários de terras e cafeicultores no interior paulista. Filho de Goffredo Teixeira da Silva Telles, Prefeito de São Paulo, SP, por ocasião da eclosão do movimento constitucionalista (1932), e Presidente do Conselho Administrativo do Estado de São Paulo durante o Estado Novo (1940-1943).

Profissão: Advogado e professor universitário.

CARREIRA (OU TRAJETÓRIA) PROFISSIONAL: Formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, SP (1937). Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da USP (1938).

Livre-docente de Introdução à Ciência do Direito na Faculdade de Direito da USP (1940).

TRAJETÓRIA POLÍTICA: Na década de 1930, foi um dos principais dirigentes da AIB - Ação Integralista Brasileira, em São Paulo. Durante o Estado Novo, foi membro do Conselho Penitenciário de São Paulo (sem data). Primeira legislatura. Após a Constituinte de 1946, votou contra a cassação do PCB (1947).

LIGAÇÕES COM ASSOCIAÇÕES E MOVIMENTOS SOCIAIS: Quando estudante, pertenceu durante cinco anos à linha de centro da AIB (1933-1937). Durante a década de 1930, percorreu o interior paulista divulgando a doutrina integralista com o auxílio de padres locais. Foi membro do Instituto dos Advogados do Brasil e da OAB (1935).

ATIVIDADE IDEOLÓGICA OU TEÓRICA: Colaborou em várias revistas jurídicas e publicou Justiça e júri no Estado moderno (tese, 1938); A definição do Direito (1941); O sistema brasileiro de discriminação de rendas (1946); A lei dos homens (1946); e Tratado da conseqüência (1949).

ATUAÇÃO CONSTITUINTE: Membro do Partido de Representação Popular - PRP, agremiação liderada por Plínio Salgado e que agrupava os ex-integralistas, elegeu-se pela legenda do PSD em virtude de acordo eleitoral entre as duas agremiações, embora na Constituinte se manifestasse sempre em nome do PRP. Parlamentar ativo em plenário, concentrou sua atuação na abordagem de questões referentes à organização do aparelho fiscal e tributário, na defesa da autonomia municipal e no combate doutrinário ao comunismo e ao PCB. Assim, ocupou a tribuna para proferir discursos justificando extensamente várias propostas de sua autoria aos capítulos sobre "Discriminação de Rendas" do projeto (VI, 49-60), onde combateu as sugestões apresentadas anteriormente por seu correligionário Horácio Lafer (PSD/SP) sobre o assunto, a seu.ver, prejudiciais à autonomia dos Municípios; solicitando inserção nos Anais da Assembléia de longo estudo de sua autoria sobre matéria tributária contendo uma apresentação sistemática de suas sugestões ao projeto constitucional (IX, 372-400) e examinando o materialismo marxista, dialético (IX, 240-247), no qual procurou refutar ponto a ponto a doutrina marxista e afirmar princípios doutrinários alternativos à mesma, declarando o marxismo "morto" e ultrapassado, pontos de vistas estes que provocaram veementes apartes contrários de parlamentares da bancada comunista. À certa altura dos trabalhos de elaboração constitucional, causou sensação em plenário ao realizar pronunciamento sobre matéria constitucional (XVIII, 298-306) onde, em nome do PRP, combateu veementemente a emenda n" 3.159, assinada por várias lideranças pessedistas (Costa Neto, Nereu Ramos, Acúrcio Torres, Benedito Valladares e Gustavo Capanema), vedando o funcionamento de qualquer organização, cujo programa visasse a modificar o regime político e a ordem social estabelecidos na Constituição. Além disso, manifestou-se contrário ao direito de greve e foi favorável à concessão de anistia ampla aos punidos por crimes políticos durante o Estado Novo e à manutenção dos Conselhos Administrativos até a promulgação das Constituições estaduais.

Apresentou 8 emendas ao Projeto de Constituição, destacando-se as de n" 1.765 e 1.766, regulamentando vários aspectos do papel do Presidente da República no processo de elaboração de leis, e a de nº 1.954, condicionando o pagamento da contribuição de melhoria à valorização da propriedade particular beneficiada por obras públicas. Além disso, enviou à Mesa da Assembléia requerimento solicitando que "seja remetida à Comissão da Constituição, como afirmação do conceito espiritualista de vida e de destino, e em repúdio a todas as formas de materialismo, a sugestão de que conste, do preâmbulo do novo diploma constitucional, a declaração de que ele é 'decretado e promulgado em nomede Deus'" (IV, 249).

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