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O espírito público e o amor pelo Brasil que sempre impulsionaram a atividade política do Professor Goffredo são atualmente mais conhecidos em razão da Carta aos Brasileiros, de 1977, documento que sacramentou a expressão do repúdio ao regime de arbítrio e prepotência que vinha infelicitando a Nação.
Agora, sete anos depois da sua morte, decidimos reunir neste livro outros doze trabalhos de sua autoria, trabalhos que hoje não são tão conhecidos do grande público, mas que igualmente refletem a inabalável fidelidade de Goffredo aos ideais da Liberdade, da Democracia e do Estado de Direito.
Para começar, voltamos a 1949. Goffredo exercia seu mandato de deputado, para o qual fora eleito em 1945, aos trinta anos de idade, com a terceira maior votação do país. O ex-presidente Artur Bernardes passou a suas mãos um dossiê importante, e lhe pediu que preparasse com urgência um discurso na Câmara dos Deputados.
Goffredo, tomado de emoção e ciente da extraordinária importância do assunto, preparou e proferiu dois veementes discursos, demonstrando o atentado à soberania nacional que estava sendo urdido, por meio da criação do chamado “Instituto internacional da Hileia Amazônica”. Os discursos de Goffredo tiveram grande repercussão e resultaram na retirada do parlamento, pelo próprio governo, do tratado que criava o Instituto.
Passamos a 1955. O ambiente na Faculdade era às vezes de desalento, às vezes de exaltação, desde a campanha eleitoral de Jânio Quadros e de Ademar de Barros, em 1954. Goffredo relata, n’A Folha Dobrada, que discursos inflamados eram proferidos em comícios no Largo e em assembleias na Sala dos Estudantes, contra a corrupção e o desmantelo do Poder Público. Ouviam-se manifestações apaixonadas sobre um planejado golpe, contra os detentores do poder.
Foi nesse contexto que Goffredo proferiu, na Sala dos Estudantes da Faculdade de Direito, sua exposição sobre a resistência violenta aos governos injustos. O jornal O Estado de S. Paulo a publicou na íntegra, em três longos artigos, e o trabalho foi também transcrito na Revista da Faculdade de Direito, e em várias outras revistas do país.
De 1970 a 1974, Goffredo organizou e coordenou os cursos de pós-graduação na Faculdade. A aula de encerramento do seu curso de pós-graduação em 1976 foi gravada, permitindo que chegassem assim até nós, na íntegra, suas considerações sobre a representação política, feitas no conturbado ano que antecedeu a Carta aos Brasileiros.
A preocupação de Goffredo com as questões atinentes à Justiça Social permeia suas reflexões apresentadas na conferência nacional da OAB de 1982, e no congresso nacional dos advogados pró-constituinte, em 1983, quando já se fortalecia a mobilização em favor da convocação de uma assembleia nacional constituinte.
A seguir, muito se empenhou Goffredo na campanha por uma assembleia constituinte eleita para a finalidade exclusiva de elaborar a Constituição. Em nome de centenas de entidades representativas da sociedade civil, reunidas no Plenário Pró-Participação Popular na Constituinte, Goffredo dirigiu ao governo, em 1985, sua Carta dos Brasileiros ao Presidente da República e ao Congresso Nacional, clamando por uma assembleia constituinte desvinculada do Congresso Nacional e das engrenagens do governo.
Durante o período da ditadura militar, a dívida externa brasileira cresceu vertiginosamente, em operações sigilosas que implicavam transferência anual de considerável parte do PIB, a título de pagamento de juros. É o que motivou o Professor Goffredo, em 1986, a elaborar circunstanciada exposição sobre a dívida externa dos países em desenvolvimento, exposição que proferiu em Conferência internacional sobre esse tema, por ele presidida.
O mês de outubro de 1988, em que foi promulgada a vigente Constituição Federal, foi marcado em São Paulo por intensa agitação. Diversas categorias de funcionários públicos estavam em greve por melhores salários. As manifestações de repúdio à política do então governador, Orestes Quércia, eram reprimidas com violência. Para assegurar que a manifestação seguinte, pacífica e sem armas, pudesse ocorrer nas imediações do Palácio dos Bandeirantes, o Professor Goffredo impetrou o primeiro mandado de segurança coletivo, para garantir o exercício do direito de reunião, assegurado pela Constituição.
Em 1989, como em muitos outros anos, Goffredo foi eleito patrono da Turma que então se graduava na Faculdade de Direito da USP, turma que teve o nome de “Centenário da República”. Na ocasião, dirigiu um emocionante discurso aos formandos, exortando-os a formar uma grande aliança, uma aliança dos filhos das Arcadas.
O início do ano de 1990 foi marcado pelo trágico confisco dos ativos depositados em instituições financeiras. Goffredo nessa ocasião redigiu um manifesto intitulado Em defesa da Constituição, em que exprimiu o repúdio de todos os signatários à violação da Constituição.
Em 1993, uma forma de interpretar o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias levou à formação de um movimento revisionista, que pretendia alterar a Constituição sobre qualquer matéria por meio de um processo legislativo facilitado. Goffredo posicionou-se com firmeza contra essa interpretação, por meio de sua Segunda Carta aos Brasileiros, uma mensagem lida por ele no Salão Nobre da Faculdade, em que defendeu uma interpretação estrita do dispositivo e a adoção do procedimento mais dificultoso das emendas para todas as alterações da Constituição.
Cada um desses trabalhos revela-se pleno de sentido e de propósito, no contexto em que se situa, no desenrolar da vida brasileira. Esperamos que com a iniciativa de publicá-los agora, postumamente, tenhamos contribuído para que eles continuem a frutificar no coração das futuras gerações.
São Paulo, abril de 2016
Maria Eugenia Raposo da Silva Telles
Olivia Raposo da Silva Telles